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Friday, July 20, 2012

O Pegador de pipas

As crianças sairam. Foram com a Ju e a minha sogra rumo ao interior. Voltam só na segunda-feira, entao terei o fim de semana só para mim. Para refletir, ler e escrever.
Faz frio em São Paulo. Muito frio. 
Me perdi na internet depois que eles se foram. Vendo uma coisa aqui que me levou a outra coisa ali e dai alguém fez um comentário no Face e eu fui responder. Alguém me lembrou de algo e eu fui pesquisar e um link me fisgou e fui para outra pagina e quando vi, nem vi, era ja três horas da tarde....tocaram a campainha.
Pela janela aberta vejo o filho do vizinho. Um menino enorme. Deve ter uns 12 anos, mas puxou pro pai e ja tem barriga e um corpão meio desengonçado. Já é maior do que eu. Vive sempre de boné e passa o dia na rua a empinar pipa em meio a fiação dos postes e as árvores da minha casa. Nada detem a ele e seus amigos, nem o frio. Só a chuva, e tem que ser daquelas grossas pois se for so chuvisco eles estarão lá.  As vezes eu vejo as crianças de minha janela, já anoiteceu e eles ainda estão na rua empinando pipa. Olho pro céu e não consigo ver pipa nenhuma, mas eles veem, ou pelo menos sentem onde a pipa esta pela comunicação ou vibração que devem receber no final da linha, aqui na terra.
Volta e meia eles aparecem aqui, principalmente este menino grande, pedindo para entrar no quintal e resgatar uma pipa que ficou presa em algum galho de árvore.  As árvores do meu quintal são enormes e guardam lá em cima o esqueleto curtido e lavado de várias pipas que não conseguiram ser resgatadas.  Em algumas das árvores há linhas penduradas, com pedras e paus amarrado nas pontas, balançando ao vento,  testemunho de inúmeras tentativas dos meninos em alcançar as pipas, que tentaram com estes artefatos, prendê-las e puxá-las para baixo.
Agora vejo aquele menino alí. Acabei de entrar na página do meu banco para ver o quanto pobre estou hoje. Por um segundo penso em ignorá-lo, mas desisto. As janetas estão aberta e sabem que eu estou em casa, e além disto eu já sei o que ele quer, basta deixá-lo entrar por um minuto e pronto.
A pipa dele esta enrroscada no alto de um coqueiro que tempos na frente de nossa casa, próximo a garagem. Uma pipinha que não deve valer nem um Real, mas que é o que ele tem no momento para brincar. A linha da pipa se estende como uma barriga do alto do coqueiro atá algumas plantas espinhosas perto do portão. Eu entro no meio dos espinhos e acabo encontrando o fim da linha. Estico a linha e penso em passar para ele por meio da grade do portão para que ele dê lá as suas puxadinhas dali mesmo e consiga desvencilhar a pipa do coqueiro.  Mas resolvo dar alguns puxões eu mesmo e com isto acabo arrebentando a linha. Metade dela ainda presa a pipa fica esvoaçando ao vento, mas muito alta para ser alcançada. O negócio agora e tentar aquela técnica que eles tem, de amarrar uma pedra na ponta de uma linha, girar a linha com a pedra na ponta para pegar impulso e jogá-la lá no alto, na esperança que ela fique engatada a pipa para poder assim puxá-la para baixo.
Ele tenta. Ele tem muita habilidade e eu fico ali a vê-lo dar várias tentativas, mas a pipa não vem. Ele esta num ângulo impossível e só conseguirá arrebentar a linha ou prender a pipa ainda mais.
Entro, pego minha chave e abro o portão para ele. Ele tenta agora puxar a pipa de bem debaixo do coqueiro, mas depois de alguns minutos vê que também não adianta.
- Deixa prá lá. Diz ele.
- O que? Vai desistir assim? Vamos lá do outro lado e tentamos por lá.
Ele se anima todo. Existe uma outra parte mais elevada da minha casa que dá acesso ao coqueiro por um outro ângulo e quem sabe de lá ele consiga. Damos a volta pela casa, passamos pela dispensa e eu o deixo lá a atirar sua pedra amarrada a uma linha. Subo até o segundo andar de minha casa com o rodo na mão. Lá em cima abro uma janela que está a mais ou menos uns dois metros da árvore e estou bem próximo da pipa. Mas mesmo me esticando todo pela janela com o rodo na mão, mal consigo dar umas cotucadinhas na árvore. A pipa, vejo, está presa num cacho meio seco de coquinhos. Lá embaixo ele continua atirando sua linha ainda sem resultados.
Há vários vizinhos do outro lado da rua acompanhando nosso trabalho. Crianças e donas de casa me vendo alí meio pendurado por causa de uma pipinha ralé.
Não tem jeito. Nisto vejo um galho comprido de uma outra planta que tenho lá embaixo. Quem sabe com aquele galho...
Desço, pego o facão, corto o galho e tirando raminhpos e folhas desnecessárias. Subo com aquela vara na mão e agora da janela consigo tocar a pipa. Encostando o galho na rabiola, eu o rodo e com isto a pipa fica presa no galho. Com muita calma eu puxo o galho e a pipa vem com ele. Perdemos somente um meio metro de rabiola que se arrebentou.
Ufa, que trabalho. No fim disto estou até meio suado. Me esqueci da internet, me esqueci do frio, e nesta tarde sem muito o que fazer, sem querer, eu fiz uma criança feliz.